Afinal, quem foi Laurita Ortega Mari?
O fato marcante foi que sua eleição como mulher, causou verdadeiro frisson, não só na classe política, mas no empresariado e no povo em geral
Laurita Ortega Mari, com seu jeito, muitas vezes criticado, ganhou o carinho do povo taboanense
Por Armando Andrade
Foi em Taboão da Serra que tivemos a primeira prefeita eleita do Brasil. Aconteceu nas eleições de 06 de outubro de 1963, quando a então candidata Laurita Ortega Mari, disputando a eleição com outros quatro candidatos, graças aos seus 1.347 votos, num universo de pouco mais de 3.000, tornou-se a primeira mulher a conquistar o cargo de prefeita de um município brasileiro, pelo voto direto, depois de na eleição anterior ter perdido para o Prefeito Nicola Vivilechio, por pequena margem de votos.
Grande parte dessa brilhante vitória foi atribuída ao enorme apoio recebido do ex-governador Adhemar de Barros e de sua esposa Leonor Mendes de Barros, na época, muito queridos em toda região.
Seus adversários obtiveram votação bem inferior à vencedora. José Domingues de Morais Filho, apoiado pelo prefeito de então, obteve 557; Arthur Felix 452; José Martins 439 e Pedro Vasque Giovanolli 71 votos.
Outra peça importante de sua consagradora vitória foi seu esposo, Francisco Ettore Pedro Mari, o principal articulador da campanha, que embora paraplégico, foi um verdadeiro leão na difícil missão da conquista de votos, articulando, fechando acordos e ouvindo o povo em suas principais reivindicações para depois transformá-las em plano de governo.
Logo depois da proclamação oficial de sua vitória, pelo Tribunal Regional Eleitoral, pipocaram mensagens de cumprimentos. Governador Adhemar Pereira de Barros; General Aldevio Barbosa de Lemos, Secretário de Segurança Pública; Presidente do Senado de República, Auro Soares de Moura Andrade; Deputado Federal Amaral Furlan e tantos outros.
O fato marcante foi que sua eleição como mulher, causou verdadeiro frisson, não só na classe política, mas no empresariado e no povo em geral.
Na época vice-prefeito também era votado e nem sempre o que formava chapa com o prefeito conseguia ser o escolhido, tendo sido exatamente aconteceu. O candidato da chapa da prefeita, Bernardino Ferreira Torres obteve 841 votos e foi derrotado pelo candidato Oswaldo Cesário de Oliveira, pertencente à chapa do candidato derrotado José Domingues de Moraes Filho, depois de ter conquistado 1.064 votos. Os demais candidatos, João Clemente de Oliveira conseguiu 267 votos, Vicente Buscarini (Pai do ex-prefeito Buscarini) 241 e Elias Schultz 116 votos.
Laurita Ortega Mari, que nos dois anos anteriores a sua eleição declarou guerra ao prefeito da época Nicola Viviléchio, teve seu mandato prorrogado por mais um ano, em razão das alterações constitucionais promovidas pelo governo militar que assumira em abril de 1964 e só terminou seu período em 31 de janeiro de 1969, quando passou seu cargo para o prefeito eleito com seu apoio, Ary Dáu.
Depois de ter deixado a Prefeitura, elegeu-se vereadora e cumpriu seu mandato de quatro anos. Voltou a ser candidata a Prefeita em mais duas eleições, mas não conseguiu seu intento.
Morreu em outubro de 1977, sendo, até hoje, lembrada com muito carinho por todos que a conheceram e por aqueles que ouviram comentários de fatos importantes da sua vitoriosa caminhada.
A mãe dos pobres
Logo no início da sua administração, a Prefeita Laurita, conhecedora da pobreza de boa parte da população da cidade preocupou-se em montar um serviço de assistência social. Estabeleceu um convênio com o Padre Carlos Spaniol, vigário da Igreja de Santa Terezinha, e montou em salão pertencente à igreja, o Serviço de Assistência Social.
Sob seu comando e a seu convite, passou a contar com a diretora geral Maria José Luizetto Buscarini a sempre lembrada Dona Zeza, mãe de José Vicente Buscarini, que viria a ser prefeito da cidade.
Quem comparecia religiosamente, todas as semanas na Assistência Social, para dar seu apoio e incentivar outras voluntárias, era a Diretora da Escola Antonio Inácio Maciel e das escolas isoladas da cidade, Neide Gonçalves, alguns anos depois, eleita vereadora com a maior votação da época.
O serviço teve um início bastante dinâmico. Ministrava aulas de confecção de enxovais de recém nascidos e roupas em geral, para uso próprio e também para que as alunas pudessem aprender a costurar para terceiros; distribuía leite em pó para crianças carentes, através de programa da Aliança para o Progresso, criada pelo governo americano do presidente John Kennedy; mantimentos, cobertores e roupas recebidas em doação.
Como funcionava em dependências da Igreja central, também ministrava orientação moral e cristã para as mães que freqüentavam àquele órgão. No Natal e na Páscoa era uma grande festa: As crianças das escolas primárias, hoje denominadas de ensino fundamental, recebiam brinquedos e ovos de páscoa.
Pode até ser que nos dias atuais não soe bem, mas o fato é que por tudo isso que começou a fazer desde o início de sua administração, a Prefeita acabou ganhando o cognome de “Mãe dos Pobres”, mesmo tendo alguns a chamá-la de “demagoga” e outros de “politiqueira paternalista”.
A realidade é que Dona Laurita foi uma prefeita bem popular. Era também muito vaidosa. Ia diariamente à cabeleireira e não saia de casa sem uma maquiagem básica. Em suas andanças pela cidade, sorria e acenava para todos e quando passava por qualquer velório, que naquele tempo eram realizados nas próprias casas dos falecidos, não titubeava, entrava e chorava com os parentes do morto, embora às vezes nem conhecesse o falecido. Fazer o que? Era sua maneira de ser!
Era costume promover jantares na Granja Laurita, onde residia, tendo como anfitriões além dela seu marido Chico Mari, que presidia o PSP, partido político ao qual pertenciam, que sempre contava com a presença de políticos e empresários.
Conta a lenda que na cidade tinham dois empresários de ônibus, que disputavam a preferência da prefeita com o objetivo de obter melhores percursos para suas linhas. Numa dessas reuniões, para que o concorrente ouvisse, ela falou a um deles alto e bom som: “-Fiquei muito emocionada com as flores que o senhor me mandou. Muito obrigada!” Não deu outra. No dia seguinte sua casa estava repleta de arranjos de flores enviadas pelo outro concorrente.
Na verdade a prefeita fazia o papel de chefe de governo, enquanto seu marido, mesmo não sendo funcionário da prefeitura era uma espécie de “Primeiro Ministro”. Mas, uma coisa tinha, quando ela cismava com alguma coisa não havia marido ou primeiro ministro que a demovesse do que pretendia.
Outra coisa que ela fazia e muito bem era visitar os órgãos do governo do Estado ou a Assembleia Legislativa, para reivindicar verbas e obras para a cidade. Circulava pelos corredores oficiais com muita desenvoltura, sempre tendo a frente um ou dois assessores anunciando que ali estava Laurita Ortega Mari, a primeira prefeita eleita no Brasil.
Artigo publicado no Portal O Taboanense pelo ex-prefeito Armando Andrade em 2012