Artigo de Claudia Funari: Liberdade de expressão e notícia falsa
por Claudia Funari
Liberdade de expressão e notícia falsa não se confundem. A liberdade de expressão é um direito resguardado pela Constituição Federal, no artigo 5º, graças a esse direito podemos expressar livremente nossas opiniões e convicções. Quando a parte “atingida” por essa opinião sentir-se ofendida pode recorrer à justiça.
Casos configurados como injúria, calúnia, difamação, racismo, incitação à violência, ameaças são passíveis de processo e punição. Quando quem proferiu a ofensa é uma pessoa física, uma empresa, uma empresa jornalística é possível identificar e processar.
E quando essa opinião tida como ofensiva pela pessoa ou instituição atingida é feita por centenas e milhares de perfis nas redes sociais, como é possível processar e punir?
E quando essa opinião tida como ofensiva é dada embasando-se em notícia falsa, que nada tem a ver com a realidade e é divulgada por centenas e milhares de perfis verdadeiros? E quando são centenas e milhares de perfis falsos os chamados robôs? Como é possível processar e punir?
E quando as notícias falsas surgem massivamente no mesmo dia, em diferentes redes, mas é possível traçar um objetivo comum entre elas e até semelhanças? Se você acompanha as redes sabe do que eu estou falando.
Centenas de notícias falsas espalham-se pelas redes diariamente, com a pandemia do Covid-19 elas se intensificaram mais ainda. Cito dois exemplos que pode ser que você tenha visto nas redes.
Um vídeo com caixão com pedras foi exibido como se o caso tivesse acontecido em Manaus, durante a pandemia de Covid-19, nada mais enganoso. Tomou enormes proporções na rede, colocando em cheque o número de mortos atingidos pela Covid-19 na cidade.
Outra notícia falsa viralizada apontava que no Estado de São Paulo todas as mortes deveriam ser contabilizadas como causa mortis a Covid-19 e como “comprovação” usava-se recorte de portaria publicada no Diário Oficial do Estado, na página 5, do dia 21 de março, que diz o seguinte: “Considerando que, segundo órgãos da Saúde Pública, durante a situação de pandemia, qualquer cadáver, independentemente da causa da morte ou da confirmação de exames laboratoriais deve ser considerado um portador potencial de infecção por Covid-19”.
Trata-se de uma parte da Resolução 26 da Secretaria de Segurança Pública paulista, que estabelece as diretrizes para manejo dos casos de óbito na pandemia como medida sanitária para que não haja contaminação das pessoas envolvidas no serviços de autópsia e funerário. E não tem absolutamente nada a ver com contabilizar a causa mortis.
Pois bem, a interpretação equivocada da portaria, transformou-se na disseminação de uma notícia falsa, onde os propagadores apresentavam como prova o publicado pelo Diário Oficial. Como muitos tem dificuldade de interpretar textos jurídicos, científicos e similares, acabam sendo presas fáceis dos propagadores.
Da apreensão de notícias falsas desse teor é possível apreender outras dezenas de conclusões equivocadas. A Covid-19 não é perigosa. Estão inventando mortos. Os médicos que atestam a causa mortis não são confiáveis. Todo o sistema de registro de causa mortis foi corrompido. Enfim conclusões que colocam em risco a pessoa que acredita na notícia falsa e que causam grande confusão.
Qual a intenção de afirmar que Manaus está fabricando mortos? Por que o Estado de São Paulo estaria inflando os casos de Covid-19 ? Como uma notícia falsa dessa natureza espalha-se tanto e tão rapidamente?
Uma coisa é você criticar pessoas, instituições e políticas públicas, outra bem diferente é inventar mentiras para sustentar suas opiniões e usar as redes em escalas gigantescas para que as pessoas sejam levadas a conclusões falsas. Isso é terrorismo digital.
E nesse caso, como identificar e processar os propagadores?
Claudia Funari jornalista, pós-graduada em Gestão de Processos Comunicacionais e mestre em Ciência da Comunicação.